Letras

A Passeata

Seus sonhos se contrastaram
Com a realidade nua é crua
Suas idéias viraram faixas
Nas passeatas da rua

Vieram cem homens fardados
Trazendo a repressão
Trotando cavalos negros
Espalhando a dor pelo chão

O grito parado no ar
Pedia apenas comida
E os cassetetes em brutas mãos
Queriam apenas bater

Mais novos cavalos surgiam
Cavalos fardados também
E ele sozinho na praça
Lutando sem mais ninguém

De repente um grito estranho
Alguém se desesperando
Passaram por cima de um sonho
Passaram cavalos trotando


Assassinato de um Líder Rural


Agora tens a terra que querias dividida
Agora tens a terra pela qual lutaste em vida
Agora tens a terra, o motivo da tua morte.
Agora tua família está jogada à própria sorte
Agora tens a terra que querias dividida
Mas do que adianta a terra
Se já perdeste a vida

Assassinaram o líder rural

E até quando vamos ver impunidade e injustiça sobreviverem
Até quando vamos ver impunidade e injustiça. 


Bom Futuro


Na Vila Bom Futuro que futuro é que há
Para as meninas que ainda moram lá?
Cidade pequenina encravada no sertão
Abandonada pelos donos da nação

Maria Aparecida sem nenhuma opção
Desapareceu quando passou um caminhão
Dizem que já foi vista lá pras bandas da cidade
Com dois filhos na calçada vivendo de caridade

Má sorte teve mesmo Maria Anunciação
Ganhou dinheiro fácil em cima de um colchão
Pegou doença fácil, que infelicidade,
Anunciaram sua morte bem na flor da idade

Dois destinos parecidos, dois caminhos diferentes
Continua a mesma coisa, só mudou a geração,
As cidades continuam abandonadas no sertão


Extermínio


A tarde veio olhar o corpo no chão,
Um minúsculo pedaço do futuro do país
Todos vendo o corpo em exposição
Todos lamentando o final infeliz
Mas acontece que agora
Não adianta lamentar
Era só uma criança
Cuja rua era seu lar
Ninguém sabe ao certo
Quem foi que a matou
No fundo foi mais um
Que a sociedade exterminou
Quatro balas tatuadas no peito
Uma poça de sangue pintada no chão
Será sepultado como indigente
E uma triste estatística pra nossa nação

Jovem Brasileiro


Os nossos sonhos estão apodrecendo
O racional está perdendo a razão
Ainda estamos presentes no passado
E temos o futuro como obrigação

Imprevisível é o meu destino
Imprevisível é o seu também
Somos apenas estranhos no ninho
Perdidos na terra de ninguém
O ontem não interessa
O amanhã nunca existiu
Hoje sou apenas mais um jovem
Lutando pra viver no Brasil
Sofrer, morrer é sempre essa a opção.
Tentar viver, sempre corremos atrás da ilusã

Liberdade Onde está?

Seja em casa ou na escola
Seja no trabalho ou em qualquer lugar
Você nunca estará totalmente livre,
Pois sempre tem alguém pra te dominar

Liberdade onde está?
Em nenhum lugar

O estado só existe pra te dominar
O patrão só existe pra te explorar
A igreja só existe pra te doutrinar
A televisão existe só pra alienar

Liberdade onde está?
Em nenhum lugar

Aproximação Imperialista*

Na primeira noite eles se aproximam
E roubam uma flor
E não dizemos nada
Na segunda noite, já não se escondem
Pisam as flores, matam nosso cão
E não dizemos nada.

Até que um dia o mais frágil deles
Entra sozinho em nossa casa
Rouba-nos a luz, e conhecendo o nosso medo
Arranca-nos a voz da garganta
E já não podemos fazer nada.

Fora parasita
E vê se deixa livre essa nação
Fora parasita
A gente já cansou de exploração

Caos Urbano

Olha o horizonte industrial
Olha o sangue coagulado no asfalto
Olha o engarrafamento
Olha a ação policial
Olha o povo com medo de assalto
Caos urbano, caos urbano, caos
Olha a morte na contramão
Olha a miséria dormindo na calçada
Olha a hora do rush
Olha a poluição
Olha a festa da elite na madrugada
Caos urbano, caos urbano, caos

Foi Boto Sinhá**

Tajá-panema chorou no terreiro
E a virgem morena fugiu no costeiro
Foi boto, sinhá
Foi boto, sinhô
Que veio tentá
E a moça levou
No tar dançará
Aquele doutô
Foi boto, sinhá
Foi boto, sinhô
O boto não dorme
No fundo do rio
Seu Dom é enorme
Quem quer que o viu
Que diga, que informe
Se lhe resistiu
O boto não dorme
No fundo do rio...
Tajá-panema se pôs a chorar
Quem tem filha moça é bom vigiá!

O Prisioneiro

A milha liberdade vive trancafiada
Entre quatro paredes pagando uma pena
Na sua timidez vive sempre assustada
Insegura, frustrada, morrendo apenas

Ela é toda desconfiada
E chora minguante o dia perdido
O tempo passando de forma veloz
E eu aqui me achando bem mais protegido

Talvez lá fora
O mundo se esqueça que eu vivo aqui
Por que agora
As grades me prendem
E eu não posso sair

Sou prisioneiro deste mundo
Que eu criei pra resistir
Meu filho, baixa essa arma
Guarda o brinquedo e vamos dormir

A Cidade

Com o amanhecer do dia
O desafio de sobreviver
Na selva de concreto que o próprio homem criou

Concretos preconceitos e em todas as capitais
A pressa das buzinas e a miséria dos sinais

Cenas cotidianas de fome e de dor
A mão estendida pedindo
A mão estendida assaltando
No coração o ódio que o transformou
Mais e mais virão, por que ninguém se importou

A cidade é a vitrine
Da nossa decadência
A elegância da elite
Se contrasta com a indigência

* Aproximação Imperialista / Incidental: Vladimir Maiakovski
** Foi Boto Sinhá / Incidental: Maestro Waldemar Henrique
Demais músicas: Márcio Siqueira (Beto)

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